Desde que o mundo é mundo – e para nós, lá se vão uns quinhentos anos – que o subúrbio é latente do povo brasileiro. Talvez por tal motivo a idéia principal desta coluna tenha se transformado de subúrbio carioca em meu suburbano coração. Limitar o subúrbio ao Rio de Janeiro é uma injustiça sem tamanho.Enquanto pensava na concepção deste espaço buscava em minhas raízes, material biográfico pra preencher folhas em branco. E qual não foi meu espanto quando me vi pensando além mar.
Quem conhece Portugal vai entender do que estou falando. Talvez de todos os países europeus Portugal seja o mais brasileiro que possamos encontrar. Também, pudera. Nossos colonizadores deixaram por aqui uma semente cultural indissolúvel, que vai desde o idioma até uma interminável ordem de doenças trazidas à bordo da nau. Pensar Portugal é se ver naquele povo, é encontrar um felicidade inexplicável e certa vergonha de possuí-la.
É considerar que se a definição de subúrbio contida no Aurélio, for realmente sincera, toda nossa extensão de terra até hoje se encontra delimitada a essa realidade. Brasileiro é sub urbano por natureza. Somos uma tentativa forçada de repetição. E talvez por isso tenhamos tanto charme. Suburbano que se preza, imita, mas acaba fazendo do seu jeitinho. Um jeitinho todo especial. Distante de Portugal estamos, e isso é fato. Tem um oceano aí no meio que não nos deixa mentir. Mas a distancia se limita às milhas dessa ponte aérea. Portugal é aqui.Em cada esquina se pode ver um beco frio de janelas justa-postas onde se beiram ruas e avenidas que levam a lugar nenhum. Por ali e por aqui há varal, crianças brincando nas ruas, vizinhos que se preocupam com as vidas alheias, fofocas, intrigas e uma receptividade que não se sabe de onde vem. Ali a mentalidade é atrasada, preconceituosa, religiosa e machista. Portugal teme a Deus, e castiga aos homens. A moral e os bons costumes rezam sua conduta, tal qual o mais interiorano comportamento mineiro. Em Portugal, as mulheres ainda sonham em casar de branco. E há fila pra confissão nas igrejas...
De Portugal não se vê a Europa. De fato, nem a própria Europa os vê ali. Fosse a situação diferente não haveria tanto savoir faire no estilo luso-brasileiro de ser. Talvez acabássemos com cara de Bariloche assemelhando-nos a mais insuportável espécie de Argentino já existente. Ou acabaríamos devendo favores eternos aos descobridores de gente já descoberta. E, diga-se de passagem, totalmente descoberta no calor dos trópicos.Certamente eles sabem que se eles têm Camões, nós temos Paulo Coelho... Sei, sei,...o exemplo não é dos melhores. Mas preferi citar esse a lembrar que se eles têm Felipão, nós temos Dunga! Em Portugal a culinária é rica, as mulheres roliças, as casas agrupadas e a brisa do mar nos faz lembrar constantemente que há coisa melhor do que àquele país, mas que nunca se trocaria o berço por qualquer PIB milionário do planeta.
Achando ou não a grama do vizinho mais verde que a sua, nada se compara a sensação que se têm quando se volta pra casa. Assim bate o suburbano coração, orgulhoso de seu berço esplendido, e de carregar a marca de um povo que sabe receber, e não faz exigência de RSVP.
[Tudo muito lindo na política da boa vizinhança. Mas se tratando de Carlota Joaquina ela que bata o pó de suas sandálias e deixe nossa baianidade nagô (afinal foi por aquelas bandas que nasceu o Brasil) falar mais alto! Vá dançar o vira com as cabrochas bigodudas e deixe nossas mulatas globelezas empolgar o carnaval. ]
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